sábado, 10 de dezembro de 2016

Gritos e feras

Sou um pequeno menino, que mora num pequeno bairro, de uma pequena cidade, de um grande país de proporções continentais, que fica num grandioso planeta, que é só um entre bilhões de outros planetas em sabe-se lá quantas outras milhares de milhões de galáxias. 

Muitos dizem que somos como grãos de areia na praia, em comparação a grandiosidade do universo. Eu discordo. Essa comparação é ainda imprecisa. Não somos nada. 

Nada!

Somos apenas um átomo num universo gigantesco, de proporções tão grandes que é impossível de se conceber. E ainda assim insistimos em querer acreditar que nosso sofrimento é importante. Ainda temos a ilusão de crer que nosso amor seria capaz de qualquer coisa. Oh, como somos tolos...

Não somos capazes de nada... Poderia por acaso um grão de poeira fazer diferença na imensidão do universo? Não, pois ele desaparece ante essa imensidão. Da mesma forma os homens, que desaparecem frente a multidão do mundo que o cerca. 

E a imensidão desse mundo não só oprime, mas esmaga completamente. Destrói. E como uma explosão no vácuo, nossos gritos não são ouvidos senão em nosso próprio coração. 

E como esses gritos ecoam de forma poderosa... Batem nas paredes de nossa alma e reverberam em nossa mente, e como ecos não se deixam ser esquecidos, pois quando seu som começa a se dissipar, um outro grito ainda maior abafa o primeiro. 

As vezes temos vontade de gritar. Gritar como se nossa vida dependesse disso. Tenho vontade de fazer isso até minha garganta sangrar, de verdade. Mas temo que o grito seja algo libertador, e com isso eu posso estar libertando o louco que há muito luta para sair de dentro de mim. 

Ele já há muito espera pelo momento de sua liberdade. 

Quando este dia chegar, ele não se deixará mais ser controlado pelas correntes que antes o aprisionaram por tanto tempo. Não mais deixará de fazer aquilo que acredita ser o melhor para si.

E aí se encontra meu maior medo, pois para conseguir se libertar, ele precisa quebrar as algemas que o prendem no subsolo dessa grande prisão. No entanto, essas algemas são na verdade uma metáfora para o meu eu, para o meu lado consciente, e quebrar essas prisões significa destruir esse recipiente que hoje impedem que eu saia por aí como um louco alucinado pelas ruas, gritando desesperadamente e ateando fogo nas coisas. 

Sim, de fato essa seria minha vontade.

Mas acho que gritar não adiantaria muita coisa, afinal, apenas estaria libertando uma fera selvagem, e de feras o mundo já está repleto... 

Se pensar bem, quase todos são como os animais, e temos a prepotência de nos chamar de "racionais". Quanta ilusão. Somos tão animalescos quanto eles. Dependemos de nossos próprios instintos para viver, e somos guiados por nossos próprios apetites... De perto, todos nós somos controlados por nossos ímpetos mais profundos. 

Gula

Luxúria

Ganância

Inveja

Preguiça

Orgulho

Ira

Essas são basicamente nossas funções mais primitivas. Nossos apetites mais latentes, e assim como os animais, somos dominados por elas. Essas são as verdadeiras forças que regem nossa existência patética. Por isso deveríamos nos livrar delas o quanto antes, mas já estão tão incrustadas em nossas vidas que as vezes parece ser impossível separá-las das pessoas que somos.

É quando olhamos pra uma pessoa e vemos que na verdade, não estamos mais olhando para um homem e sim para uma massa de luxúria ou ira vestindo uma casca humana. Nos deixamos dominar de tal forma por essas forças que logo nos tornamos parte delas...

E quando isso acontece, já não temos mais o direito de nos chamar "humanos". Não o somos mais. 

Mas afinal, se perdemos as características que supostamente garantiam nossa humanidade, o que nos restou em nossos corações, senão apenas desejos e instintos primitivos? 

Esses desejos nos transformam em animais, animais que não mais sabem amar ou perdoar, apenas conseguem gritar, como bestas, a ecoarem pelo mundo seus instintos incompreensíveis. 

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