quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Ira


Orgulho

Gula

Luxúria

Ganância

Preguiça

Inveja

Ira

Segundo uma definição que encontrei na internet, "a Ira é o intenso e descontrolado sentimento de raiva, ódio, rancor que pode ou não gerar sentimento de vingança. É um sentimento mental que conflita o agente causador da ira e o irado. A ira torna a pessoa furiosa e descontrolada com o desejo de destruir aquilo que provocou sua ira, que é algo que provoca a pessoa. A ira não atenta apenas contra os outros, mas pode voltar-se contra aquele que deixa o ódio plantar sementes em seu coração. Seguindo esta linha de raciocínio, o castigo e a execução do causador pertencem a Deus."¹

Partindo então dessa definição eu hoje escrevo como um homem que deixou-se controlar toda e completamente pela ira.

Tudo estava silencioso. Mas o silêncio não era sinônimo de calmaria, pelo contrário, guardava em sua névoa ensurdecedora um grito poderoso, capaz de acordar até mesmo as mais assustadoras feras que se escondiam nas profundezas do ser e do pensamento.

E aquela fera adormecida, que jazia esquecida pelo mundo, agora uma vez acordada, somente irá se satisfazer quando destruir tudo aquilo que um dia perturbou o seu sossego.

Um urro fantasmagoricamente ressoou por toda a terra, abalando as montanhas e causando maremotos que destruíam a costa. 

Os gritaram de pavor. As mulheres em desespero caíram em prantos. As crianças paralisadas de medo eram as únicas que olhavam atentamente a temível criatura enquanto ela destruía a tudo e todos que encontrava pela frente.

Seus dentes dilaceravam a carne das pessoas que atormentadas pelos uivos de dor de seus parentes e amados não conseguiam se mover. Todas eram apenas presas fáceis aquele monstro violento e poderoso que subjugava a todos com sua fúria.

Em poucos minutos cidades inteiras foram cobertas de sangue, os gritos deram lugar aos gemidos dos poucos sobreviventes que esperavam a morte enquanto jorravam a cor púrpura pelas ruas.

Deixando um rastro de destruição por onde quer que passasse, tudo o que resultava dali era o medo, a dor e por fim, a morte.

Depois de uma longa noite de dor e tormento, a criatura aos poucos foi sentindo-se sonolenta e frágil. Aos poucos recobrava a razão e abandonava seu lado animalesco, voltando aos poucos a sua forma humana...

Uma vez recuperado de seu desvario, ele olhou para trás e ao se assustar com a visão aterradora da destruição, olhou para suas próprias mãos, cobertas de sangue ainda quente.

Ele fora a causa de toda aquela dor, de todas as vidas que se foram como nada. Ele fora a causa de todas aquelas mortes.

De joelhos ao chão ele se deu conta de seu erro, de deixar-se dominar por seus instintos... Tendo agora controle sobre seu próprio corpo, ele poderia usar sua garra para algo melhor do que seria tirar todas aquelas vidas. De uma vez por todas ele poderia fazer algo bom. 

Usou suas garras para destruir sua própria garganta. Caiu sobre o chão frio, aquecendo-o com seu próprio sangue, que turvando sua visão de vermelho agora preenchia seu coração de satisfação, ao saber que não mais causaria dor a ninguém.

A ninguém.

A ira é a cor vermelha que domina a carne e a visão. Na verdade se baseia na carne para cegar a visão, como a maiorias dos outros pecados. Mas a Ira é absurdamente destrutiva. Enquanto a Luxúria e a Inveja destroem o homem de dentro para fora, a ira o faz partindo de fora. Faz com que a fera adormecida do homem desperte e assim destrua tudo a seu redor. 

Uma vez dominado pela ira ele mata a todos, sem mesmo se dar conta de que os ama. Apenas quer sentir a carne sendo dilacerada por suas garras e presas. No entanto, quando acorda de seu sonho ele percebe o que fez. Percebe a destruição que causou e se desespera. E nesse desespero a destruição que ele causou ao mundo volta-se completamente contra ele mesmo em seu interior, devastando assim onde suas garras não conseguiram alcançar.

Aqueles dominados pela ira se tornam um mostro sedento por sangue e acaba destruindo aos outros e por fim, a si mesmo. É o pecado da dor, da destruição, do horror. É o pecado dos monstros que matam até mesmo aqueles que amam. É o pecado das atrocidades, das aberrações.

A ira é a destruição que, dominando o homem, o faz objeto de sua própria força destrutiva. E a ira é aquela que, destruindo a tudo, por fim, encontra em seu receptáculo seu último alvo, destruindo por fim aquele que um dia destruiu em seu nome. 

Dies iræ! dies illa
Solvet sæclum in favilla
Teste David cum Sibylla!²
~

Nota: 1. Fonte: Católico orante. 2. Trecho inicial do Dies Irae, hino do séc. XIII usado na liturgia da Missa de Requiem. Tradução: "Dia da Ira, aquele dia, volverá o mundo em cinza fria,(será) David com a Sibila por testemunha!"

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