sexta-feira, 10 de junho de 2016

A Espada de Fogo - Cap. 1 ~ Bênção da Natureza

Bênção da Natureza


Será que eu nunca vou conseguir chegar lá? Já estou caminhando a horas e esse monte não chega nunca!

O Sol forte ainda me incomoda, mesmo que com todas essas plantas fazendo sombra ao meu redor ele quase não consiga mais tocar minha pele. Essa sombra também me incomoda, também me assusta. Mesmo o sol estando em seu ponto máximo acima de mim, as árvores grandes e imponentes, carregadas de folhagens espessas impede a passagem da luz em muitos pontos, formando uma penumbra grotesca. Posso sentir como se várias criaturas também se escondessem nessas sombras, já que o barulho dos meus passos quebrando os galhos e folhas secas sob meus pés é muitas vezes abafado por vários outros ruidos que vem de partes mais escuras e intocadas dessa estranha floresta. 

Afinal de contas, que floresta é essa? Eu estava num ponto alto agora a pouco mas não consegui enxergar nada que me fosse familiar. Familiar. Do que eu estou falando? Não consigo me lembrar do que eu consideraria familiar. Agora, tudo que eu consigo ver são as árvores, alguns pássaros e essa irritante luz do sol. Se bem que eu não deveria reclamar muito, pois já estou andando faz algumas horas e mais tarde vai escurecer, e se agora esse lugar já parece assustador, nem quero imaginar como será durante a noite. As criaturas maiores e famintas, que agora eu não posso ouvir pois descansam em seus esconderijos, logo vão se despertar e esse passará a ser o terrítório delas. Ai será a horas das criaturas pequenas e indefesas que agora caminham nesse lugar, se esconderem e pacientemente esperarem que a luz do sol volte a brilhar para novamente poderem andar em segurança. Obviamente eu sou uma dessas criaturas. 

Por algum motivo eu preciso chegar a base daquele monte. Daquela montanha, Não sei ao certo com devo chamar, mas desde que acordei só consigo andar em sua direção. Acelero as passadas. Tropeço algumas vezes, já que o terreno é acidentado, e as folhas e galhos encobrem as pedras e buracos desse lugar, e eu com certeza não estou habituado a esse caminho. Não que tenha um caminho a minha frente, simplesmente sigo a direção do monte. Mas isso não faz sentido nenhum. Porque eu devo chegar até esse monte antes do anoitecer? O que tem lá que possa me oferecer segurança? Quem me garante que lá nada mais é do que a toca das criaturas que dominam esse lugar.

Acabei de atravessar um pequeno riacho. A água fria e cristalina não chegava nem a minha cintura, e a visão da paisagem era sublime. Uma pequena queda D'água mais acima lançava gotículas de água por sobre as numerosas pedras e fazia um belo arco-íris, refletido pela poderosa luz do sol. Essa mesma luz, refletida na água fazia as plantas vibrarem de verde extremamente vivo, de diferente tons, uma verdade gama de cores. Mas nem mesmo essa visão espetacular me distraiu. Parei algumas vezes para recuperar o fôlego ou para observar os pássaros que vez ou outra se assustavam com os meus passos barulhentos e levantavam voo rumo ao céu azul. Mal via algumas nuvens, e até o céu desse lugar era de um azul intenso, poderoso, esmagador. Eu imaginava o monte pra onde me dirigia como o lugar onde eu poderia chegar a tocar esse céu azul. Cheguei a imaginar como seria sua textura. Será que seria frio e gelado como a água do riacho? Ou quente e abrasador como a luz do sol que me acordou horas atrás?

A lembrança de ter acordado aqui ainda martela a minha cabeça, e tentar me lembrar como eu fui parar alí faz com que eu sinta dor. Talves eu não deva mesmo me lembrar de nada. Só sei que acordei algumas horas atrás, com o sol queimando o meu rosto, em uma clareira bem grande. A primeira coisa que notei depois de me dar conta que estava deitado no chão frio foi a brise leve que balançava a grama ao meu redor, bem como o meu cabelo. Não consegui me levantar de imediato, creio que por não conseguir entender onde estava ou o que estava fazendo ali. Esperei que meus olhos focalizassem outra coisa além da grama verde e brilhante. Pude ver algumas plantinhas ao meu redor, algumas delas com flores de cores claras, mas de diversas tonalidades. Algumas eram de um rosa delicado, outras de um branco puro, um amarelo apagadinho e um creme que achei bem confortável. Algumas plantas ainda tinham algumas gotinhas de orvalho em suas folhas, mas que já começava a evaporar com o calor do sol. 

Finalmente consegui reunir forças pra sentar. Puder sentir a brisa com mais força agora no meu rosto e eu já estava aquecido pela luz. Fiquei então olhando ao redor. Era uma clareira grande, com muitas flores e uma grama que cobria cada centímetro dela. A minha direita tinha um grande tronco quebrado, onde algumas plantas já cresciam nele. Imaginei se fosse a única arvore que um dia crescera naquela clareira. Me pus de pé com uma certa dificuldade e então notei que o terreno onde estava era também um grande declive. Subi um pouco mais e quase caí com a vista com que me deparei: Estava em um lugar completamente desabitado, ate onde conseguia ver, e uma floresta extremamente fechada e selvagem se estendia como um gigantesco tapete verde escuro a minha frente. O sol brilhava forte agora e se destacava como um brilho poderoso no céu azul e sem nuvens. Apenas alguns pássaros se atreviam a manchar aquela visão, mas logo eles desciam, e o céu se tornava uma única tela que se estendia como uma abóbada sob a minha cabeça. Nem mesmo os melhores pintores do mundo juntos poderiam pintar uma tela tão perfeita. 

Mas a minha visão logo passou do ceú para a imponência que se destacava a minha frente, uma gigantesca montanha, ou monte, se erguia no que eu imaginei que fosse o centro da grande floresta. Era simplesmente titânica, soberana e se destacava assutadoramente do resto. Alguma coisa naquele monte me parecia importante, como se houvesse algo nele que eu precisasse conferir. Como se uma voz me chamasse silenciosamente para sua base. No entanto, não conseguia dar um passo sequer. Paralisado pela imponência sobrenatural da floresta e pela confusão que agora invadia a minha cabeça. Afinal, o que eu estava fazendo dormindo em um lugar como esse? Não consigo sequer me lembrar do meu nome, de nada que possa ter acontecido comigo. Nem mesmo as minhas roupas são familiares. Já acordei usando um estranho roupão preto e sandálias. Acredito que não seja um roupão de fato, deve ter um outro nome, e a peça me lembra o vesturáio asiático, mas nem sequer consigo me lembrar do motivo de eu ter essas suposições. Depois de muito esforço consegui dar finalmente um priemiro passo, e me veio um poderoso estalo, e de repente tudo se silenciou. Os passáros, o farfalhar das folhas nas arvores e até a brisa no meu cabelo. De repente parece que toda a floresta e o céu desapareceram, eu somente conseguia ver a montanha ao meu lado, pois comecei a andar rumo ao tronco, não a montanha. Percebi então que aquele deveria ser o ponto para onde eu devesse ir. O monte.

Mudei a direção, ficando de frente para o monte e comecei a andar, e de repente os sons a minha volta recomeçaram. E então eu me lancei nessa caminhada. Ainda sem saber meu nome e nem sequer o que eu estaria procurando a minha frente. E mesmo agora, horas depois de ter começado essa caminhada que parece eterna, ainda não alcancei nenhuma resposta, e nenhum monte. Será que eu nunca vou conseguir chegar lá? Já estou caminhando a horas e esse monte não chega nunca!

Acelerei a caminhada ainda mais, mesmo sabendo que não conseguiria manter aquele ritmo por muito tempo. A fome ainda não me incomodava, mas a sede sim, e eu já deixara o riacho para trás a muito tempo. Sem chance de voltar, teria de aguentar, até quando eu não sei. 

Cheguei então em uma parte ainda mais acidentada. Essa sim seria complicada. O caminho parava repentinamente num grande buraco a minha frente. Era rodeado por pedras enormes e a floresta ali, nã era mais brilhante como a que estava atrás de mim, era assustadoramente escura e certamente não era lugar para algum desavisado como eu ir entrando assim sem conhcer melhor. Mas já não havia mais volta, eu só devia continuar em frente, mesmo o monte parecendo agora ainda mais distante. 

Tentei então começar a descer por um lugar que me pareceu mais fácil. Descendo um pé de cada vez e me segurando com cuidado. Finalmente consegui colocar os dois pés numa rocha bem grande que se destacava das outras encostadas no que eu supus ser um desfiladeiro. Mas a pedra fez um barulho surdo e e senti que ela se soltava das outras. Não só se soltava como se quebrava também, e ainda faltava muito pro chão. Tentei em vão me segurar, mas já era tarde demais, e eu caia desfiladeiro abaixo, até que consegui me segurar em outra grande pedra mais saliente, que também se soltou, mas dessa vez mais próxima do chão, onde eu caí esparramado por sob os estilhaços grandes da pedra maior um monte macio do que e acredito que fosse um punhado de folhas úmidas. Me levantei ofegante e ficando de quatro, percebi que embora ainda fosse dia, aqui era mais escuro do que eu imaginava. Senti ainda um líquido quente escorrendo pelo meu rosto, e quando levei a mão para limpar, notei o quanto minha mão estava ralada e dolorida. Me levantei devagar, ainda ofegando pelo susto e por obviamente não ter preparo físico para uma empreitada como aquela. 

No entanto, mesmo estando agora de pé, eu estava paralisado em frente as arvores. Estava ainda no mesmo lugar de agora pouco? Como podia ser tão diferente? As arvores aqui não só eram muito maiores, como cresciam em formatos estranhos e contorcidos, e como as copas eram muito mais numerosas, cobriam toda e qualquer luz do sol que tentava ali penetrar. Eu devia seguir em frente, mas o medo tomou conta de mim num calafrio e meus pés não obedeciam mais meu comando. E foi quando eu comecei a ouvir algo a mais.

Alguns pássaros voaram quando gritei por ter caido. Mas logo se silenciaram. Mas agora um número maior levantou voo e fez um barulho ainda maior do bater de asas só que não foi esse o som que me chamou atenção. Foi um baque surdo ao longe, como um passo gigantesco. Não poderia ser um passo, no entanto, e sim alguma coisa grande caindo. 

Mas eu ouvi novamente. E de novo. E mais uma vez. E pude ver dois olhos vermelhos brilhando por entre as folhagens ao longe. Não poderiam ser dois olhos, estavam alto demais, quase próximos a copa das arvores. As mesmas arvores gigantescas. Os olhos piscaram, aumentaram o brilho e começaram a se aproximar, assim como os passos surdos aumentaram e se aproximaram. De fato eram passos, mas de algo que eu não poderia imaginar o que era. A coisa foi se aproximando e se antes eu ficara com medo por olhar a floresta escura, o pânico agora tomava conta de cada parte do meu corpo em constantes calafrios. Quando a criatura finalmente saiu do meio das arvores, eu pude tremer de medo ainda mais. Era simplesmente assutador. Grande como uma casa, parecia ser feito de pedra ou concreto, e suas pernas lembravam pilastras de uma grande construção, bem como sua cabeça que parecia ser o pico de uma torre, e inclusive tinha grama, ou seria musgo, crescendo nos seus ombros, aumentando ainda mais a aparência de ser um prédio vivo, mesmo a aparência humanóide ainda sendo presente. E meu medo aumentou ainda mais quando seus olhos começaram a brilhar num vermelho vivo ainda mais intenso e ele levantou a mão e estendeu na minha direção. Era rápido, mais do que sua aparência gigantesca podera sugerir.

Tive apenas alguns instantes para me mover quando um soco poderoso da criatura atingiu a parede exatamente atrás de mim, transfomando a pedra sólida em uma nuvem de poeira. Mas ele mal percebera que errara o primeiro golpe e já preparava o segundo. Eu não sei como escapara do primeiro, mas o segundo certamente era meu fim, e quando a manopla da criatura homem-prédio veio novamente na minha direção, eu só pude sentir algo dentro de mim sendo estraçalhado quando fui jogado para vários e vários metros longe dali. Bati a cabeça no chão coberto de folhas úmidas e já sentia o sangue escorrer por minha boca. Não sei como ainda consegui forças pra me virar e tentar me colocar de novo de quatro, mas já podia ouvir a coisa andando na minha direção. Fechei as mãos com força sob as folhas e a dor que eu sentia em todo o meu corpo arrebentado por aquele golpe violento foi diminuindo lentamente, bem como a velocidade com que meu inimigo se movimentava. Pude sentir alguma coisa estalar dentro de mim em estalidos surdos. Uma estranha luz verde surgiu de um círculo desenhado por alguém no chão a minha volta e logo tomou conta do meu corpo todo, e depois de chegar a minha cabeça e meu olhos, ela se tornou branca e aumentou. 

Movido então por alguma força que não sei dizer de onde viera, me pus de joelhos, e erguendo a mão direita o mais alto que pude, soquei o chão de folhas a minha frente, fazendo o círculo verde a minha volta brilhar mais intensamente. Nesse momento, uma voz de mulher disse do fundo de uma das árvores as palavras que eu repeti gritando o mais alto que pude, não só assustando pássaros a vários quilômetros dali, como aterrorizando tudo o que poderia se encontrar naquele lugar, inclusive o monstro de pedra que agora vinha correndo em minha direção com o punho gigantesco cerrado: BÊNÇÃO DA NATUREZA! 

Não entendi o significado das palavras e vi que elas não fizeram nenhum efeito em retardar meu atacante. Mas vi que a luz/aura branca que cobria meu corpo era agora mais intensa na mão que eu socara o chão, e reluzia como uma chama translúcida no meu punho. Olhei a frente e senti meus olhos queimarem. O monstro começou a mover-se lenamente novamente, ou eu finalmente percebi qe podia me mover mais rápido que ele, e antes que seu soco me atingisse em cheio na cabeça dessa vez, eu ergui meu punho de chamas brancas e parei seu ataque. 

O som que resultou do encontro de nossos ataques foi ensurdecedor, e algumas árvores racharam perto de nós. O monstro de pedra ficou parado e sua manopla começou a rachar, enquanto seus olhos paravam de brilhar e ele caia de joelhos e minha frente. Foi quando eu senti então a Bênção da Natureza agir a minha volta. O círculo verde se estendera, e onde ele brilhava agora cresciam rapidamente vários galhos fininhos coberto de folhas ainda mais verdes que as da floresta acima de mim, Não demorou mais do que alguns segundos para que toda a criatura ficasse coberta com os galhos que cresciam do círculo e que, de alguma forma, eram alimentados pela luz que saia de mim. Quando ele finalmente ficou coberto, as folhas começaram a brilhar ainda mais e eu senti que uma força entrava dentro de mim, curando os ferimentos da queda e do soco que ele me acertou. Essa força parecia ser drenada do monstro e passada pra mim através do círculo. Quando eu estava finalmente curado, até o último arranhão da mão fechado, as folhas pararam de brilhar e a criatura caiu, despedaçada a minha frente, e de fato, não passava de pedras que pareciam ter ganhado vida. O barulho da queda foi alto, e poderia chamar a atenção para qualquer outra coisa que estivesse naquela floresta. 

Fiquei alguns minutos olhando ainda para minha mão, enquanto sentia que meu cansaço e medo foram embora. A luz, seja a verde do círculo, ou a branca, que emanava de mim, sumiram lentamente. E eu decidi que era a hora de voltar a andar, mais uma vez, em direção ao monte. 

Precisava agora mais do que nunca de respostas. Quem eu era? Porque estava ali, e como conseguia fazer aquelas coisas? Precisava de respostas.

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