quinta-feira, 2 de junho de 2016

Das cartas que nunca serão enviadas #4


Bom, você foi de longe o maior problema da minha vida nos últimos anos. Desculpa começar essa carta assim, mas eu tive de usar de algo que exprimisse com força aquilo que você me fez passar e que eu tento superar até hoje, e que provavelmente vai deixar uma cicatriz com seu nome pro resto da vida na minha alma. 

Dito isso, vamos ao que eu tenho pra te dizer de verdade.

Te conheci bem antes do que você imagina. Uma semana antes de te ver pela primeira vez, eu ouvia os professores conversando sobre você nas várias reuniões do corpo docente da escola onde eu tinha acabado de começar meu estágio. Fiquei bem curioso pra conhecer você depois de ouvir tanta coisa. Conheci então seu irmão antes de você. Um carinha brilhante, meio bagunceiro, mas muito gente boa. E no dia seguinte, conheci você. Sim, contrariando todas as expectativas, eu consegui diferenciar vocês dois de primeira. E sim, diferente da maioria que adora comparar vocês dois pela aparência, eu diria que nunca conheci duas pessoas tão diferentes na vida. Te achei logo um cara incrível. Mega inteligente, quando você quer, de fato aprende direitinho. E puta que pariu, como você é lindo. Eu fiquei simplesmente hipnotizado por você, não tinha olhos pra outro nem se o modelo mais bonito do mundo batesse na minha cara. Tem uma personalidade original, extremamente afetada. Único.

Comecei a tentar me aproximar e como você mostrou resistência, me aproximei do seu irmão, e não demorou muito até conseguir desarmar você. Mas eu esperei até dar mais um passo. Quando meu contrato finalmente expirou e eu já não tinha mais nenhum vínculo com sua escola, te chamei pra sair, e qual foi minha surpresa em você aceitar. 

Adorava quando você falava sobre os livros do John Green sem parar, mesmo só tendo lido um único livro dele e não conseguindo acompanhar muita coisa. Mas eu podia literalmente ouvir sua voz de veludo por horas. Olhar pra sua franja despenteada que você ajeita sem parar a cada 5 minutos. Seu sorriso tímido de quem esconde uma dor enorme. Igualmente as muitas fotos que você tira de casaco, pra cobrir os numerosos cortes nos braços pra que as pessoas não te julguem mais do já o fazem. Podia te olhar por dias. 

Finalmente ficamos pela primeira vez. E não estaria exagerando se dissesse que eu nunca vou esquecer nosso primeiro beijo, naquela sala de cinema, com a música de O Mágico de Oz como fundo. 

Do mesmo jeito que minha felicidade foi completa naquele beijo. Minha tristeza também o foi na semana que se seguiu. Foi sua primeira crise. 

Começou a me ignorar online e pessoalmente também. Não olhava mais nos meus olhos, passava sempre direto. E quando falava comigo, era rude e seco. Como se quisesse me obrigar a esquecer o que tinha acontecido. Admito, quase entrei em depressão por causa disso. Mas passou tão rapida e inesperadamente quanto começou. E você voltou a ser o que era antes. O menino tímido que tinha muito a esconder do mundo, mesmo sendo um livro aberto pra todos. Ou talvez pra mim. Ironicamente, eu sempre te entendi muito bem, até mais do que eu gostaria, mas isso não ajudou em nada quando tive de lutar contra suas crises, e em nada eu pude te ajudar, pelo contrário, me enlouqueço de pensar que provoquei muitas delas. 

Ficamos mais algumas vezes, todas seguindo esse mesmo padrão. Você me procurava, respondia minhas mensagens, pedia pra me encontrar e depois que ia embora, mudava completamente; Cheguei a contar 10 minutos entre nosso encontro e sua mudança abrupta de personalidade. Comecei a me acostumar com essas duas pessoas coexistindo dentro de você. Poderia conviver com isso se deixasse. Mas ai, aconteceu algo que eu não esperava: O seu eu de depois acabou vencendo as disputas internas que aconteciam dentro de você. 

Você então se afastou permanentemente. O ano acabou. Você viajou. Brigamos muitas vezes. Você me excluia, me bloqueava e sempre voltava atrás. Mas como disse, o seu eu de depois venceu e você nunca mais me procurou ou me respondeu. Depois você se mudou. Eu me mudei. Até conversamos algumas vezes depois disso, mas nada voltou a se repetir. 

Ora, o estrago já estava feito a muito tempo. Eu me apegara de uma forma violentamente perturbadora. Uma relação baseada unicamente no masoquismo que era suportar você e suas crises. Mas eu já e repito, se me permitisse, ainda hoje estaria suportando bravamente. E olha que elas me faziam chorar constantemente de desespero de nunca ter você de volta. Quando você falava coisas sem sentido, quando dizia coisas que eu sabia serem mentiras, me odiava por estar contribuindo com isso que te destrói. Mas eu só queria estar com você e lutar por você, mesmo que seus pais me matassem. Não me importaria de morrer se fosse por você. Eu dizia até com certa frequencia, usando a letra de uma música, lembra?

"E quando anoitecer, cansado eu te encontrar, no silêncio teu, eu irei te consolar...
Nos braços meus, descansará, forças te darei!"

Infelizmente eu só pude assistir a você se afastar cada vez mais. E mais uma vez assistir a luta interna que te corroia. Um dia me cumprimentava na rua. No outro passava para o outro lado da calçada pra não me ver. No outro me gritava pra que te notasse. Como se isso fosse preciso, eu sempre estava bem consciente da sa presença perto de mim. Lamento dizer que já á vários meses não o vejo pessoalmente. Somente assito a distância ao seu drama. Ou assistia, já que agora nem nas redes sociais mais tenho acesso a você. Mas acredite quando digo que cada postagem sua, por mais boba que fosse, tinha pra mim o significado que você gostaria que tivesse pra todos. Eu sei bem de tudo que você gostaria de contar pros seus pais, dos sentimentos que nem você entende muito bem. Das coisas que você gostaria de dizer pro seu irmão, do quanto você odeia viver à sombra dele. Das coisas que nem seus amigos mais próximos sabem, porque você tem tanto medo do que eles possam fazer, que esconde e inventa mil e uma histórias pra fugir das contestações óbvias. Eu sei.

Sei também que meu tempo com você passou. Foi curto, coisa de poucos meses. Mas o sentimento que eu tenho por você não sumiu ainda, mesmo anos depois de sua partida, e acredito que nunca vai desaparecer. Gostar de você é sem dúvida a maior loucura que já fiz. E ainda guardo até hoje a agenda daquele ano onde você escreveu as letras das suas músicas favoritas na página do dia 22 de outubro, exatamente uma semana depois do nosso primeiro beijo. Pra você ter uma ideia, do quão importante foi pra mim. 

De qualquer forma. já me aproximo do final. O nosso ponto final eu já dei, quando te exclui de uma vez por todas de tudo. E você nem se deu o trabalho de responder. Como sempre. Mas isso um dia vai passar, eu provavelmente vou tornar a ler essas linhas e só conseguir me lembrar muito vagamente de um dia ter te amado. Você vai estar feliz, eu espero, com algum outro cara. E eu, não sei onde vou estar, em algum lugar por aí, mas com certeza, ainda me lembrando do seu sorriso e do seu olhar. Pode acreditar. Eu ainda vou te amar. Pode acreditar.

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